Há 120 anos atrás, um ilustre aristocrata português, D. Jorge de Avillez, residente na vila de Santiago do Cacém, recebeu, na alfândega da cidade de Lisboa uma encomenda muito especial, um automóvel Panhard Levassor, um veículo com motor capaz de circular a 20 quilómetros por hora. Era uma coisa inacreditável, um veículo sem cavalos, capaz de mover-se sozinho, coisa nunca vista em Portugal!!! Imagine-se a curiosidade e o pasmo das gentes de Lisboa ao ver desembarcar tão estranho veículo.
Na alfândega foi necessário registar e taxar o veículo, o que constituiu um verdadeiro problema, já que nenhum dos diligentes funcionários daquele posto de controle de mercadorias o era capaz de classificar. Como fazer? Classificá-lo como uma máquina agrícola ou como um locomobile, um veículo movido a vapor? A segunda hipótese levantada foi aquela que fez mais sentido e o primeiro automóvel existente em Portugal, um veículo a motor de combustão, foi registado como um veículo a vapor.
D. Jorge Avillez e o seu grande amigo, José Benedito Hidalgo de Vilhena, naquele longínquo dia 11 de outubro de 1895, ansiavam por fazer a travessia do Tejo para que, chegando à margem sul do rio, pudessem dar início à longa viagem que tinham pela frente até Santiago do Cacém, 150 quilómetros a 15 quilómetros à hora, era uma jornada interminável.
Com a ajuda preciosa de um mecânico, foi possível pôr o veículo a funcionar e, para pasmo do curiosos que assistiram a tal manobra, os três homens iniciaram a viagem da margem sul do Tejo até Santiago do Cacém.
Ao entrar na vila de Palmela, um aparatoso acidente quase estragou aquela primeira viagem de automóvel, pois um burro teimoso, habituado à pacatez das velhas estradas e caminhos de terra batida, não conseguiu escapar-se a tempo às rodas do veículo automóvel e levou uma tal pancada que o deixou atordoado e sem vida à beira da estrada. Por sinal, o dono do automóvel era um senhor conde, rico e endinheirado, pelo que o problema do atropelamento do burro não foi difícil de resolver. D. Jorge de Avillez, assumindo a culpa do acidente, abriu a carteira e entregou ao dono do burro dezoito mil réis, dinheiro que, na altura, era suficiente para pagar três burros. Resolvido o problema, sem intervenção de autoridades, pois tal necessidade não se fazia ainda sentir em Portugal, os três homens puderam realizar, em paz e sem mais acidentes de percurso, a viagem até Santiago do Cacém.
O primeiro automóvel português é hoje um objeto de museu e encontra-se em exposição ao público no Museu da Alfândega da cidade do Porto.
Foto em cima. arquivo MTC/Luís Ferreira Alves
O automóvel que poderás observar no vídeo é um protótipo (um modelo idêntico) ao veículo mencionado no texto que acabaste de ler.